Com olhos redondos, orelhas finas e um sorriso de quem aprontou alguma, Labubu é daqueles personagens que ou encantam ou assustam. Uns acham o bichinho fofo – outros não entendem a excitação em torno dos monstrinhos nem o consumo desenfreado que gira em torno dele. O desenho nasceu do artista de Hong Kong Kasing Lung e virou boneco de plástico nas mãos da empresa chinesa Pop Mart. O objetivo era mostrar o lado bagunçado e divertido das pessoas. O que começou como arte para poucos virou febre em todo o planeta e, agora, virou peça de luxo e sinal de que se tem dinheiro.

Do gibi para a passarela – o monstrinho vira moda
Dua Lipa, Lisa do Blackpink e Rihanna começaram a carregar o Labubu preso em bolsas caras. O boneco aparece em looks que misturam fofura e aspecto feio, leveza e treva – o estilo que chamam de dark kawaii.

O Labubu já não é só brinquedo. Virou marca e referência, capaz de representar a mistura entre ironia, nostalgia e individualidade que define a moda contemporânea.

A febre das blind boxes e o prazer no imprevisível

Parte desse sucesso vem das blind boxes, as caixas-surpresa onde o comprador só descobre qual boneco adquiriu ao abrir. Essa lógica de sorte e mistério desperta uma sensação quase infantil de expectativa e recompensa.
Por outro lado, também ativa mecanismos de consumo emocional e compulsivo.

Os modelos raros, chamados chasers, alimentam o mercado de revenda. Um boneco vendido por cerca de R$ 300 pode alcançar R$ 4.000 online. Assim, o que começou como arte virou mercadoria de especulação, com fãs disputando lançamentos como se fossem investimentos de luxo.

Moda, status e pertencimento

O fenômeno do Labubu vai além da estética. Ele reflete como o desejo de pertencimento é constantemente alimentado pelo consumo. Ter um Labubu pendurado na bolsa não é apenas uma questão de estilo — é uma forma de dizer: “eu também faço parte desse mundo”.
Além disso, em um cenário digital movido por tendências e validação social, o monstrinho se tornou símbolo de um novo tipo de identidade: compramos para sermos vistos, desejados e aceitos.

O surgimento dos Lafufus: o “consumo possível”

Com o crescimento da febre, surgiram também os Lafufus — versões falsificadas dos bonecos da Pop Mart, vendidas em comércios populares e sites de importação.
Se o seu Labubu tem mais de nove dentes, uma caixa brilhante demais ou um olhar meio torto, ele provavelmente é um Lafufu. Ainda assim, muita gente não se importa.

Essas cópias, mais baratas e fáceis de encontrar, se tornaram um fenômeno à parte. O público que compra Lafufus não busca autenticidade, mas pertencimento. Mesmo sabendo que o boneco é falso, o que importa é participar da tendência — é poder exibir um símbolo de desejo, ainda que em versão popular.

Esse movimento revela algo profundo sobre o consumo atual: a democratização do hype. Quando o luxo se torna inalcançável, o mercado responde com versões alternativas que permitem viver a experiência simbólica do pertencimento.
O falso, nesse contexto, não é apenas uma imitação — é também uma forma de resistência cultural, uma maneira de dizer: “eu também quero estar dentro dessa narrativa”.

O consumo e o desejo

Entretanto, o fenômeno também expõe uma face inquietante do nosso tempo: o consumismo disfarçado de afeto.
O que parece um gesto inocente — colecionar algo fofo ou expressar estilo — muitas vezes reflete uma necessidade constante de preencher vazios emocionais com novas aquisições.
A cada lançamento, o desejo se renova, mas a satisfação dura pouco.

Além disso, a lógica das blind boxes simboliza perfeitamente o ciclo do consumo moderno: comprar sem saber o que se está comprando, movido apenas pela emoção da surpresa.
O prazer está menos no objeto em si e mais no instante em que ele é conquistado.

Assim, o Labubu deixa de ser apenas um personagem carismático. Ele se transforma em um espelho da nossa relação com o consumo — uma mistura de encanto, ansiedade e necessidade de pertencimento.

Um monstrinho que revela a humanidade

No fim das contas, o Labubu é um símbolo poderoso do nosso tempo: imperfeito, contraditório e encantador, como o próprio ser humano.
Seu sorriso torto reflete nossa busca incessante por sentido em meio ao excesso.
O sucesso dos Lafufus, por sua vez, nos lembra que o consumo não é apenas sobre o que podemos comprar, mas sobre o que queremos sentir ao fazê-lo.

Talvez o verdadeiro charme do Labubu não esteja em seu design nem em seu valor.
Ele está na ironia que carrega: um monstrinho criado para questionar a perfeição acabou se tornando o espelho mais honesto de uma sociedade que consome até o que é estranho — contanto que seja tendência.